
Especial | Memórias Yandê
Ỹbỹ Festival. Eu disse Ỹbỹ Festival. Ỹbỹ Festival! O nome ecoa como os sons dos tambores e maracás antepassados ressoando em memórias presentes de nós, os povos originários, também conhecidos como nações indígenas ou simplesmente indígenas. Entre 29 de novembro e 1º de dezembro de 2019, São Paulo, no Unibes Cultural, foi palco do primeiro festival de música indígena contemporânea do Brasil — um marco totalmente idealizado e realizado por indígenas. Fruto de seis anos de trabalho da Rádio Yandê desde sua fundação em 2013, a maior rádio indígena do país, o Ỹbỹ Festival nasceu para ser mais que um evento: é inspiração, agradecimento e, acima de tudo, autonomia. Seis anos depois, em 2025, revisitamos a Memoriância Indígena nesse momento histórico no “Especial Memórias Yandê” para entender seu impacto e os ecos que ainda vibram na arte, na cultura e na luta dos povos indígenas brasileiros.
No “Especial Memórias Yandê”, relembramos o Ỹbỹ Festival com as vozes que o construíram. Anápuàka Tupinambá, um dos pilares das histórias e memórias da Etnomídia Indígena como criador do conceito e idealizador da Rádio Yandê, conversou com a Rádio UESC e definiu o Ỹbỹ Festival como “o orgulho e a autonomia dos povos indígenas que criaram o mercado da arte e do entretenimento”. Para ele, o festival foi um agradecimento aos comunicadores, artistas e colaboradores que caminharam junto à Yandê, mas também um grito de resistência. “Vem de inspirações espirituais, de luta, de política, para tirar da invisibilidade os povos originários do Brasil e do mundo, e, através da arte e do entretenimento, além de nos divertir, vamos mostrar quem são os povos deste mundo”, explica.

Amplificando a Arte Indígena
Qual o peso do Ỹbỹ Festival para o cenário contemporâneo da arte indígena no Brasil? Anápuàka responde: “A arte indígena sempre foi tratada por outros — artistas, pensadores, educação, economia. O Ỹbỹ veio para potencializar e amplificar isso”. Assim como a Rádio Yandê deu voz aos artistas indígenas, o festival consagrou esse movimento, abrindo espaço para políticas públicas e um mercado próprio. “Do mesmo jeito que a Rádio amplificou os artistas da música indígena brasileira, conseguimos potencializar esses grandes artistas. O Ỹbỹ vem consagrar tudo isso, mas também focar e buscar políticas econômicas e um mercado para os povos indígenas nesse cenário”, reforça.
O evento trouxe gêneros diversos — rap, forró, rock, MPB —, cantados em línguas indígenas e português, além de ações como debates sobre políticas públicas, exposições como “RePangea” (em realidade virtual, por Anápuàka “que não ocorreu por problemas burocráticos institucionais”), desfile de moda com Beni Kadiwéu e uma feira de empreendedorismo indígena. Essas iniciativas conectaram tradição e modernidade, ampliando o alcance da cultura indígena contemporânea.
Línguas e Resistência em Tempos Críticos
Em 2019, ano em que a UNESCO e a ONU celebraram e deram início ao Ano Internacional das Línguas Indígenas, o Ỹbỹ se ergueu sem apoio dessas organizações. “Pensando em mais de 274 línguas indígenas, contra os 519 anos do português colonizador, o que apresentamos é a pluralidade dessas línguas”, diz Anápuàka. Num contexto de crise política e “violência direta pelo Estado, principalmente pelo presidente da República”, o festival se propôs a fortalecer a cultura brasileira, mostrando que “somos línguas, etnias, nações indígenas, povos originários”. Para Anápuàka, o Ỹbỹ foi “uma mudança na história da comunicação, da arte, do entretenimento e, principalmente, do protagonismo indígena contemporâneo do Brasil”.
Os Desafios de Fazer Acontecer
Por trás da celebração, a produção executiva enfrentou batalhas diárias. “Nossa produção está padecendo, sofrendo todos os dias”, admite Anápuàka. O plano inicial era grandioso: um festival no Ibirapuera, com orçamento robusto. Mas os custos exorbitantes — “cobraram fortunas por cada diária” — levaram a nossa equipe a optar pelo Unibes Cultural na Oscar Freire em SP, um evento que foi gratuito para o público, sustentado por uma campanha de captação coletiva no Benfeitoria; a força comunitária fez o Ỹbỹ acontecer.

A Voz de Edivan Fulni-ô
Edivan Fulni-ô (@edivanfulnio), outro protagonista do festival, levou seu show e sua ideologia ao palco. “Tô muito feliz por participar da primeira edição do Ỹbỹ Festival, um momento histórico. Me sinto eufórico”, conta. Para ele, o evento marcou a estreia de um repertório verdadeiramente indígena na música brasileira. “É a primeira vez que nós, indígenas, somos protagonistas em todos os sentidos, tocando e ouvindo nossas próprias canções, sendo finalmente representados na música indígena brasileira, ou melhor, na música brasileira.”
O festival também homenageou Galdino Pataxó com o Prêmio Galdino de Música Indígena. Edivan, que conheceu o território Pataxó em T.I. Caramuru Catarina Paraguaçu, em Pau Brasil, Bahia, e compôs “Carta do Índio Galdino”, reflete: “Galdino se tornou um ícone no movimento indígena. Esse prêmio traz a memória das lutas e fortalece, de uma maneira grandiosa, nosso espírito de resistência. Como canto na música, ele ressuscitou nos corações dos povos indígenas”.
Impacto nos Eixos e Ações que Fizeram História
O Ỹbỹ e a Yandê tocaram em eixos fundamentais com impactos imediatos e duradouros. Na arte, deu visibilidade a artistas como Edivan Fulni-ô, plantando sementes para nomes como: Brôs’Mcs, KatuMirim, Gean Ramos Pankararu, Edivan Fulni-ô, Djuena Tikuna, Wakay, Suraras dos Tapajós, Ian Wapichana, Brisa Flow, Marcia Wayna Kambeba e Tara Williamson, poeta, musicista, cantora e compositora indígena do povo Ojibwe e Cree, de Turtle Island (Canadá), hoje em palcos globais. Nas línguas, usaram a música como ferramenta de preservação cultural. No protagonismo, posicionou indígenas como criadores, não coadjuvantes. Economicamente, mostrou um modelo colaborativo viável, apesar dos desafios financeiros enfrentados com dívida do festival até o dia de hoje.
As ações do evento — shows, debates, o Prêmio Galdino da Música Indígena Brasileira, exposições, o desfile de moda da estilista indígena Benilda Kadiwéu e intervenções artísticas indígenas e a feira de empreendedorismo indígena — foram um marco de inclusão. Debate sobre políticas públicas para a arte indígena, incluindo a inclusão artística na cidade de São Paulo e Brasil. A gratuidade garantiu acesso amplo, refletindo valores indígenas de reciprocidade, enquanto o prêmio incentivou a profissionalização artística.
Reverberação Após Seis Anos
Seis anos depois, o Ỹbỹ Festival segue vivo no cenário indígena brasileiro e está se reinventando para novos cenários e territórios. A visibilidade gerada em 2019 ecoa em artistas que hoje integram festivais mainstream e projetos financiados por leis como a Paulo Gustavo. A Rádio Yandê consolidou-se como referência em etnomídia indígena, inspirando podcasts como “Originárias” e fortalecendo a comunicação indígena autônoma. O festival influenciou editais como o Prêmio Vovó Bernaldina e abriu espaço para feiras e exposições em 2025, embora políticas públicas ainda avancem lentamente. Em tempos de retrocessos, como o marco temporal, o Ỹbỹ plantou sementes que amplificou o florescer do rap indígena (ex.: Oz Guarani) e em orquestras como Teko Arandu.
Um Passo para o Futuro e um Legado que ainda Pulsa
“A Rádio Yandê veio revolucionando, criando nosso próprio espaço”, diz Edivan Fulni-ô. O Ỹbỹ foi o primeiro passo rumo a uma representatividade musical autêntica. “Vocês, indígenas, não tinham referências de cantores indígenas quando questionados, mas a mudança está acontecendo”, celebra. Ele prometeu: “Em breve, terá música indígena contemporânea nos palcos das suas cidades, com Gene, Papo e Urubu. Vida longa ao Ỹbỹ!”
Relembrar o Ỹbỹ Festival é reacender o fogo da luta e da criação. Foi um evento que amplificou as vozes, desafiou a invisibilidade e plantou sementes para um mercado cultural indígena soberano. Em 2025, confirmamos: o Ỹbỹ Festival foi o maracá e tambor que anunciou um novo tempo. Que venham mais edições, mais palcos, mais memórias.
Reportagem original da Rádio UESC (@radiouesc), com produção de Blenda Cavalcante, Viviane Quixadá e André Levi, locução de Matheus Albuquerque e edição de Blenda Cavalcante e Matheus Albuquerque. Adaptada e ampliada para o Especial Memórias Yandê.
Ỹbỹ Festival. Ỹbỹ Festival. Ỹbỹ Festival.
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Por Redação Rádio Yandê e Ỹbỹ Festival | 20 de março de 2025*