1ª Assembleia de Tuxauas: 51 anos de histórias de luta e resistência

Registro da 2ª Assembleia de Chefes Indígenas, na comunidade Munduruku, na Franciscana do rio Cururu. Foto: Acervo/Cimi

Em 17 de abril de 1974, na comunidade de Daniel Cabixi, liderança de Diamantino, Mato Grosso, nascia a 1ª Assembleia de Tuxauas. Realizada ao ar livre, com lideranças indígenas sentadas na grama ou em troncos, essa reunião marcou o início de um movimento que transformaria a luta pelos direitos dos povos originários no Brasil. Desde então, 56 assembleias foram realizadas em territórios de pelo menos 13 estados brasileiros, reunindo cerca de 85 povos — mais da metade dos povos indígenas oficialmente reconhecidos na época.

Esses encontros fortaleceram a identidade indígena, com povos como os Kayabi, Rikbaktsa, Tapirapé, Nhanbikuara e Apiaká afirmando suas distinções culturais e políticas, declarando orgulhosamente: “nós Kayabi”, “nós Rikbaktsa”, “eu Nhanbikuara”.

Origem e organização

A primeira assembleia, conduzida com apoio do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), foi um marco, embora sua dinâmica inicial tenha sido sugerida por missionários. Já na segunda assembleia, em maio de 1975, o povo Munduruku assumiu a liderança, e a terceira, em Meruri, foi completamente organizada pelos Bororo. Essas reuniões, realizadas em um contexto de resistência à tutela militar imposta pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), deram voz às lideranças indígenas e impulsionaram pautas como a demarcação de terras, incluindo territórios como a Terra Indígena Raposa Serra do Sol.

Entre 1974 e 1975, sete encontros de Pastoral Indigenista, realizados entre a primeira e a segunda assembleias, deram origem aos Regionais do Cimi, ampliando a articulação do movimento indígena em diversas regiões do Brasil.

Comunicação e Narrativas Indígenas

Primeira página do depoimento de Marçal de Souza Tupã-Y, publicado no Boletim Cimi Nº 38/1977.

Boletim do Cimi, um jornalzinho datilografado, foi muito importante na divulgação das vozes das lideranças indígenas. A partir das assembleias, abriu-se espaço para narrativas, como as de Nelson Xangrê (Kaingáng), Ângelo Kretã (Kaingáng) e Marçal de Souza Tupã-Y (Guarani Nhandeva), que se tornaram pilares do Movimento Indígena. A edição nº 38 do Boletim, de julho de 1977, destaca a 8ª Assembleia, realizada nas Ruínas de São Miguel, no Rio Grande do Sul, um momento de conexão entre povos do Centro-Oeste e do Sul do Brasil:

“Chegamos ao fim da picada, ao fim da estrada: ou nós avançamos ou nós nos entregamos ao branco. Meus irmãos, chegou a hora de levantarmos a voz pela sobrevivência da gente, que antigamente foi um povo feliz, um povo despreocupado.”

— Marçal Tupã-Y, Boletim Cimi Nº 38, 1977.

Depois, muitas produções de comunicação e informação, elaboradas por comunicadores indígenas, foram ganhando força, como o Jornal Indígena, uma publicação da Coordenadoria Regional Sul da UNI, com sede no Departamento de Comunicação, em Perdizes, São Paulo. Também A Palavra do Índio que, em sua edição de Nº 1, apresenta relatos datilografados da 12ª Assembleia de Chefes Indígenas, realizada em dezembro de 1978, além de montagens e colagens de notícias sobre a temática indígena divulgadas pela grande mídia impressa. A edição trazia na capa, o desenho do rosto da liderança Paresí, Daniel Cabixi:

Desenho de Daniel Cabixi na capa do jornal A Palavra do Índio, de 1978.

51 anos de luta: o legado das Assembleias

Em 2024, para celebrar os 50 anos da 1ª Assembleia de Tuxauas, cerca de 60 lideranças de 20 povos, incluindo Bakairi, Kayabi, Xavante, Bororo, Tupinambá, Kaingang e Guajajara, reuniram-se em um encontro histórico. Sem a presença de não indígenas, as lideranças discutiram os desafios atuais do Movimento Indígena, como a ameaça aos direitos territoriais garantidos pela Constituição de 1988. O resultado foi uma carta que repudia a proposta de conciliação sobre a lei 14.701/2023, reafirmando a luta contra o marco temporal.

É preciso que as Assembleias de Tuxauas sigam se fortalecendo, a partir do chão das comunidades, em conexões e compartilhamentos de conhecimentos, saberes, lutas e reivindicações. E, assim, continue trabalhando a resistência, articulação e esperança, unindo povos indígenas em defesa de seus territórios, culturas e direitos.

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