Parcerias respeitosas e baseadas na valorização da autonomia indígena são fundamentais para fortalecer um setor de mídia verdadeiramente plural e diverso, onde as narrativas dos povos indígenas ocupem o protagonismo que lhes é de direito.
França – Nos dias 26 e 27 de novembro, na sede da UNESCO em Paris se tornou palco de uma iniciativa histórica para a promoção da representatividade indígena nos meios de comunicação (Etnomídia Indígena – Global). A Reunião de Especialistas da UNESCO, em colaboração com o Fórum de Parceria de Mídia sobre Povos Indígenas e a Mídia, reuniu profissionais de mídia indígenas e não indígenas, acadêmicos, e representantes de mecanismos indígenas das Nações Unidas para abordar desafios e traçar estratégias para uma mídia mais inclusiva e representativa.
O evento, que contou com a participação de 44 especialistas de 19 países, trouxe à tona discussões profundas sobre os avanços e os entraves no setor de mídia indígena. Entre os participantes, 30 eram representantes de 27 etnias indígenas, evidenciando a diversidade cultural presente no encontro. Profissionais indígenas de comunidades remotas também tiveram a oportunidade de compartilhar suas experiências e destacar a importância de narrativas que reflitam suas vivências e lutas.
Objetivos do Fórum: Troca, Parcerias e Implementação de Direitos
Com dois objetivos principais, o Fórum proporcionou um espaço para o intercâmbio de experiências entre profissionais de mídia e buscou estabelecer parcerias sólidas entre veículos liderados por indígenas e não indígenas. Essa colaboração é vista como um caminho para implementar de forma efetiva o Artigo 16 da Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas (UNDRIP), que garante aos povos indígenas o direito de desenvolver seus próprios meios de comunicação.
Além disso, foram feitas recomendações específicas para facilitar o acesso a licenças de transmissão, promover condições de trabalho justas e impulsionar a criação de conteúdo inovador por meio da colaboração e do uso de novas tecnologias, como a inteligência artificial (IA). (Algo muito a se debater o uso de IA, e a étnica, protocolos de propriedade intelectual e coletiva indígenas, modelos de IAs Indigenas, Generative AI (GenAI) indígena e gestão e infraestrutura em servidores de indigenas).
Desafios na Mídia Indígena: Burocracia e Barreiras Sistêmicas
Embora o encontro tenha evidenciado boas práticas, também trouxe à tona os desafios enfrentados por organizações de mídias indígenas. Entre os principais obstáculos estão:
Processos burocráticos e custos elevados: Licenças de transmissão são frequentemente inacessíveis para pequenas organizações devido a atrasos nos processos e custos proibitivos, dificultando a criação de rádios e emissoras voltadas para comunidades locais.
Falta de equidade na infraestrutura técnica: Grandes veículos de mídia, ao utilizarem infraestrutura compartilhada, nem sempre dividem de forma justa os custos ou oferecem suporte adequado às organizações indígenas.
Condições trabalhistas inadequadas: Profissionais de mídia indígena destacaram a necessidade de acordos de contratação mais justos, especialmente em coproduções.
Boas Práticas e o Potencial da Tecnologia
O encontro destacou iniciativas que estão transformando o cenário da mídia indígena. A inteligência artificial (IA) foi um dos temas centrais, apontada como uma ferramenta poderosa para otimizar a produção de conteúdo, incluindo edição de vídeo, programação e análise de audiência. Soluções baseadas em IA também podem ajudar a reduzir custos e melhorar a eficiência, especialmente para mídias indígenas situadas em áreas remotas.
A automação de tarefas permite que veículos de mídia concentrem seus esforços na criação de conteúdo culturalmente relevante, enquanto a análise avançada de dados proporciona insights sobre o comportamento e as preferências do público. Esses avanços tecnológicos podem ajudar a conectar vozes indígenas a audiências globais, ampliando seu impacto.
Reconhecimento e Representatividade
Para muitos participantes indígenas, especialmente aqueles de comunidades remotas, o evento representou um marco de reconhecimento e valorização de suas contribuições para o desenvolvimento da mídia. Ao compartilhar suas experiências, esses profissionais demonstraram como a mídia indígena pode ser um agente transformador na construção de narrativas mais justas e inclusivas.
A presença de grandes veículos internacionais, como a Australian Broadcasting Corporation (ABC), Canadian Broadcasting Corporation (CBC), Deutsche Welle Akademie (DW), Swedish Radio Sámi Rádio, Coletivo de Comunicação Djagwa Etxa e a Rádio Yandê, reforçou a importância do diálogo intercultural. Essas organizações compartilharam práticas de integração e parcerias que podem servir de modelo para futuras colaborações.
Impacto e Caminhos para o Futuro
O Fórum resultou em recomendações concretas para fortalecer a mídia indígena e ampliar sua influência. Entre as propostas, destacam-se:
Apoio legislativo: Estruturas legais mais acessíveis para facilitar a criação de mídias comunitárias independentes e garantir o direito dos povos indígenas à comunicação.
Parcerias equitativas: Estabelecimento de condições justas para o uso compartilhado de infraestrutura e custos entre mídias indígenas e não indígenas.
Investimento em tecnologia: Adoção de ferramentas de IA para otimizar processos e ampliar o alcance de conteúdos.
Criação da Década Internacional da Comunicação Indigena (Etnomídia Indígena): Será proclamada pela Assembleia Geral das Nações Unidas (ONU) e organizada em colaboração com a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), com o objetivo de promover, fortalecer e proteger os sistemas de comunicação dos povos indígenas em escala global, garantindo que seus direitos à liberdade de expressão, representação cultural, social, política e soberania comunicacional sejam reconhecidos e respeitados.
Objetivos principais:
- Preservação e revitalização de sistemas de comunicação ancestrais
Resgatar e documentar práticas tradicionais de comunicação, como narrativas orais, cantos cerimoniais, grafismos e sinais visuais que refletem as cosmologias indígenas, fortalecendo sua continuidade intergeracional. - Soberania comunicacional indígena
Capacitar os povos indígenas a controlarem e gerenciarem suas próprias plataformas de mídia e redes de comunicação, promovendo narrativas que reflitam suas realidades, valores e desafios sem interferências externas. - Fortalecimento da infraestrutura de comunicação em territórios indígenas
Investir em tecnologias apropriadas, acessíveis e sustentáveis que respeitem os contextos culturais e ecológicos das comunidades, garantindo conectividade digital para inclusão no cenário global sem comprometer a integridade cultural. - Educação e intercâmbio cultural
Desenvolver programas educacionais para aumentar a conscientização global sobre a importância das comunicações indígenas (Etnomídia Indígena) como ferramentas de preservação cultural e resistência, promovendo o intercâmbio de saberes entre comunidades indígenas e não indígenas. - Combate à desinformação e representações inadequadas
Monitorar e combater a desinformação, o estereótipo e a apropriação cultural nos meios de comunicação, promovendo narrativas éticas e autênticas que valorizem a diversidade cultural. - Inovação e tecnologia sob a ótica indígena
Incentivar o desenvolvimento de tecnologias e soluções de comunicação que integrem princípios de ancestralidade e inovação, criando alternativas ao colonialismo digital. - Advocacy e formulação de políticas públicas
Apoiar governos e organizações internacionais na formulação de políticas públicas que reconheçam o papel estratégico das comunicações indígenas (Etnomídia Indígena) na construção de sociedades mais justas, inclusivas e sustentáveis.
Indicadores de sucesso:
1. Criação de um fundo global para apoiar projetos de comunicação indígena.
2. Ampliação de redes de comunicação indígena (Etnomídia Indígena) em pelo menos 50 países.
3. Produção e disseminação de conteúdos criados por indígenas em plataformas globais.
4. Inclusão das vozes indígenas em 100% dos fóruns de comunicação e mídia global.
Essa década seria um marco histórico para reconhecer a importância das comunicações indígenas (Etnomídia Indígena) como ferramentas de transformação social e ecológica, garantindo que os povos originários tenham suas vozes amplificadas e respeitadas na construção de um futuro inclusivo e sustentável. Recomenda da Criação da Década Internacional da Comunicação Indigena (Etnomídia Indígena) por: Anápuàka Muniz Tupinambá Hãhãhãe, Rádio Yandê, Conselheiro Municipal de Políticas Culturais do Rio do Rio de Janeiro, Conselheiro Indicado do Bioma Mata Atlântica do Museu Nacional dos Povos Indígenas.
Essas ações têm o potencial de transformar o panorama da mídia indígena, garantindo que essas vozes tenham um espaço de destaque no cenário global.
O Fórum de Parceria de Mídia da UNESCO não apenas abriu caminho para a troca de experiências, mas também reafirmou a importância da colaboração para a construção de narrativas inclusivas. Ao dar visibilidade às demandas e contribuições de profissionais indígenas, o evento reforça a necessidade de uma mídia que respeite e valorize a diversidade cultural.
A construção de uma mídia mais representativa é um desafio coletivo que requer compromisso de todos os setores. Como o Fórum demonstrou, parcerias sólidas e inovadoras são essenciais para garantir que as vozes indígenas liderem suas próprias narrativas, moldando um futuro mais justo e inclusivo para todos.
Povos indígenas e a mídia
Fórum de Reunião de Especialistas e Parceria com a Mídia
Gravação de eventos | Galeria de fotos
Este evento foi parte de uma iniciativa mais ampla para desenvolver um estudo global sobre Povos Indígenas e a Mídia, encomendado pelo Fórum Permanente da ONU sobre Questões Indígenas (UNPFII) em 2023 com o objetivo de examinar políticas nacionais, práticas de mídia e estruturas de financiamento, oferecendo recomendações para apoiar a representação e os direitos indígenas no setor de mídia. Dando continuidade a este trabalho, a UNESCO concluirá o estudo nos próximos meses, com as descobertas a serem apresentadas na 24ª sessão do UNPFII em abril de 2025. Para mais detalhes, saiba mais sobre os objetivos mais amplos do estudo aqui .
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Uma resposta
Excelente notícias Anápuàka.
É fundamental que tenha criado o conceito juntamente com as práticas dentro do contexto social indígena.
Somos além de que se ver , mas as essências dos nossos antepassados/ancestrais que habitam e efetivam os sonhos.
“ Eu sou o sonho do meus ancestrais “
Kowawa Kapokaja Apurinā