A Ministra Sônia Guajajara, os “Avulsos” e o Colapso da Unidade Indígena: Entre Símbolos Vazios, Fracassos de Gestão e a Crise de autoridade no Ministério e na COP30

Belém – Ministra dos Povos Indigenas, Sonia Guajajara. Foto de Ueslei Marcelino/COP30

RIo de Janeiro / Brasília / Belém — 14 de novembro de 2025
A COP30, que deveria consolidar o protagonismo institucional do Ministério dos Povos Indígenas (MPI), acabou escancarando o esgotamento político da gestão Sônia Guajajara, ministra dos Povos Indígenas e deputada federal licenciada pelo PSOL. Em vez de apresentar avanços concretos, a ministra protagonizou um dos episódios mais simbólicos de sua perda de autoridade: anunciou sua saída do cargo em meio a um cenário de fragmentação interna, críticas crescentes de lideranças indígenas e sinais inequívocos de que o ministério perdeu capacidade de articulação e comando.

O evento internacional, longe de funcionar como vitrine de políticas robustas, evidenciou a distância entre o discurso oficial e a realidade administrativa. A fala da ministra confirmou não apenas sua candidatura, mas também um processo mais profundo e grave: o esvaziamento institucional do MPI, a incapacidade de consolidar entregas estruturantes e a deterioração da confiança entre as bases que um dia a legitimaram.

O que emergiu em Belém não foi um gesto de força política, mas um reconhecimento implícito de que a gestão chegou ao limite. A COP30 não revelou uma ministra preparada para uma transição planejada,  revelou uma representante indigena que perdeu tração, perdeu apoio e perdeu o controle da narrativa que antes a

Um anúncio político que escancara uma crise

Na entrevista concedida durante a COP30 ao InfoAmazonia, Sonia Guajajara confirmou que deixará o Ministério dos Povos Indígenas para tentar a reeleição como deputada federal. O anúncio, porém, não foi interpretado como um passo natural de quem busca novo mandato, mas como o ápice de um acúmulo de desgastes.

A reação não foi de entusiasmo dos povos indígenas: foi de mais desconfiança.

Entre lideranças indígenas, o anúncio amplificou questionamentos sobre sua capacidade de entregar resultados estruturais, lidar com conflitos internos e manter coesão política. A ideia de que sua presença no governo era símbolo de avanço não se converteu em solidez institucional.

O símbolo não sustentou o ministério.

O desgaste de quem perdeu governabilidade

Guajajara já havia manifestado incômodos com o presidente Lula pela falta de apoio político e estrutural ao MPI. Mas, na prática, o que se observou foi o enfraquecimento progressivo da pasta:

  • demarcações emperradas,
  • pautas ambientais travadas,
  • orçamento insuficiente,
  • perda de atribuições para o Ministério da Justiça,
  • e baixa capacidade de articulação interministerial.

O que foi celebrado como vitória histórica em 2023 se mostrou, em 2025, um ministério esvaziado. A falta de entregas concretas alimenta narrativas de fracasso e frustração,  especialmente entre quem esperava avanços reais, não apenas presença simbólica. Um ministério de papel e figurantes indígenas no governo federal

A crítica que cresce entre indígenas: mais palco do que território

As críticas mais duras não vêm da oposição, mas de indígenas que cobram compromissos reais.

Para muitas lideranças, o MPI se tornou um “ministério de eventos” ou “Mistério dos Povos Indígenas”, marcado por:

  • viagens frequentes ao exterior,
  • participação constante em painéis globais,
  • discursos internacionais sobre clima e diversidade.
  • ausência de resposta aos povos indígenas, uma caixa preta ministerial
  • quebra de apoio a ações de políticas indígenas em todo brasil

Enquanto isso, no território, a realidade segue dura:

  • invasões de não indígenas continuam,
  • demarcações não avançam,
  • terras seguem ameaçadas,
  • e políticas efetivas de proteção não chegam.

A distância entre o brilho dos holofotes, Instagram e o chão das aldeias alimenta rejeição crescente.

O episódio Ambipar: o cheiro de desconfiança

A convocação da ministra para prestar esclarecimentos sobre um protocolo com a empresa Ambipar expôs outro ponto sensível: a suspeita de aproximação indevida entre o MPI e corporações privadas atuantes em áreas de risco ambiental.

Mesmo diante das negativas, o caso deixou rastros políticos.

Em Brasília, o simples risco de conflito de interesses já compromete a credibilidade.
Em território indígena, parcerias empresariais sem consulta ampla são vistas como ameaça direta.

Assim, a ministra saiu politicamente menor do episódio.

Demarcação: a promessa que se dissolveu

Guajajara apresentou números de homologações, mas eles ficaram muito aquém do esperado. A promessa de uma “nova era das demarcações” não se sustentou.

O mais grave: o MPI perdeu o poder central sobre a demarcação.
Se em 2023 isso seria impensável, em 2025 se tornou fato consumado.

O esvaziamento da principal agenda indígena tornou-se o símbolo da falha estratégica da gestão.

A fala que acendeu o alerta: o ataque aos “avulsos”

Durante a COP30, a ministra afirmou:

“Aqui a gente não responde por esses que chegam trazendo suas pautas de forma avulsa.”

O que poderia soar como comentário burocrático se revelou politicamente explosivo e implodindo.

Não se trata de “pautas avulsas”.
Trata-se de indígenas avulsos.

A frase expõe:

  • desconforto com a pluralidade indígena,
  • incômodo com divergências,
  • tentativa de disciplinar vozes,
  • e indício de fissura profunda na unidade do movimento.

Foi o ponto mais simbólico do desgaste.

Quando uma liderança precisa, em público, dizer quem ela não representa, é porque perdeu o controle da narrativa.

E quando perde o controle da narrativa, tenta controlar as vozes.

Isso nunca representa força, representa fragilidade.
É sinal de bastidores tensos e perda acelerada de apoio nacional indígena.

O risco político: não é impeachment técnico — é moral

Não existe pedido formal de impeachment.
Mas há um processo silencioso e corrosivo: o impeachment moral.

Os fatores estão dados:

  • distanciamento das bases,
  • entregas abaixo do prometido,
  • desgaste por conflitos internos,
  • parcerias mal explicadas,
  • uso político das agendas ambientais,
  • centralização das decisões,
  • e rejeição crescente entre lideranças regionais.

A queda, aqui, não é jurídica, é de legitimidade.
O que ruí não é o cargo: é a confiança.

A COP30 virou palco de campanha, não de gestão

O anúncio de sua candidatura durante um evento global sobre clima reforçou a percepção de que o MPI se tornou trampolim eleitoral. O gesto consolidou críticas de que a pasta foi mais usada para projeção pessoal do que para estruturação de políticas duradouras.

Para muitos, essa foi a gota d’água.

“Liderança” histórica, gestão vulnerável

Sonia Guajajara é uma “liderança” histórica.
Mas liderança histórica não imuniza ninguém contra falhas políticas.

A COP30 cristalizou a imagem de uma ministra saindo enfraquecida: menos apoiada, menos confiável, menos representativa para uma imensa parte significativa dos povos indígenas brasileiros.

O dilema é simples e grave:

Quando o símbolo não entrega o que prometeu, deixa de ser símbolo.
E quando deixa de ser símbolo, vira apenas política.
E política, quando não se sustenta, implode. 

É somente politicagem ou sempre foi?

As três perguntas que agora estão atravessando os movimentos indígenas do Brasil

Resta agora a pergunta que ecoa por aldeias, coletivos e organizações indígenas em todo o país, e que se impõe tanto aos analistas quanto às lideranças políticas: quem terá fôlego para reconstruir as pontes queimadas pela atual gestão e assumir o custo da fumaça que ainda encobre o Ministério dos Povos Indígenas? O questionamento não nasce da oposição, mas dos próprios territórios, onde a percepção de desgaste se torna cada vez mais explícita.

A essa inquietação soma-se uma segunda, crescente como brasa acesa no centro das rodas de conversa: quem será capaz de recompor a confiança perdida, estancar as rupturas internas e devolver legitimidade a uma pasta que nasceu para unificar, mas terminou por fragmentar o movimento indígena nacional? Não se trata apenas de balanço administrativo, mas de uma avaliação moral e política sobre responsabilidade histórica indígena.

E, por fim, surge a pergunta mais dura, e a mais repetida por comunicadores e jornalistas indígenas, caciques, articuladores políticos e lideranças de base: quem terá coragem de devolver o Ministério aos povos antes que ele se transforme em mais um gabinete distante, chapa “branca, um cabideiro, ocupado por quem fala em nome dos indígenas, mas já não escuta suas vozes? Até nos lembrar da Fundação Nacional do Povos Indígenas (Funai) também.

Essa é a interrogação que nenhum discurso consegue silenciar. É ela que, neste momento, define a encruzilhada política do movimento indigena.

Redação Rádio Yandê @radioyande | Anápuàka Tupinamba @anapuakatupinamba | Raquel Carneiro @rgcfox

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